Excelência, consistência e cuidado

Incorporamos o conhecimento técnico e a essência do pensamento estratégico para percorrer caminhos de segurança e prosperidade com nossos clientes.

Entre em contato

Escritório de São Paulo

O digital tax europeu e a reforma Tributária no Brasil

29/07/2019

Fonte: JOTA

Não precisamos de mais um tributo que traga novas incertezas ao setor

É intenso o debate na comunidade internacional sobre a justa tributação da renda das gigantes da internet. Alguns países, como a França, tomaram medidas recentes para evitar que essas empresas transfiram todo seu lucro para jurisdições com baixa carga tributária, deixando ao menos parcela desse lucro no país onde se dá o consumo.

A reforma tributária em pauta reacendeu o debate acerca da tributação dessas empresas no Brasil e, especialmente, da criação de um imposto sobre serviços digitais tal como ocorreu na França. Na semana retrasada, o presidente da Comissão Especial da Câmara que deve analisar a proposta de reforma tributária objeto da PEC 45/2019, deputado Hildo Rocha, afirmou que um dos focos de trabalho da comissão é encontrar meios de tributar as empresas da internet que, na sua visão, apenas captam recursos no país sem deixar aqui qualquer parcela de receita.

A discussão sobre a tributação da economia digital é, sem dúvida, essencial, mas deve ser norteada pelas premissas corretas (previsibilidade da tributação e isonomia).

A premissa de que as multinacionais da economia digital não recolhem tributos no Brasil tem apelo, mas não é verdadeira.

Duas principais razões afastam essa premissa. Primeiro, o mercado brasileiro tem uma série de particularidades que obrigam as maiores empresas do setor a se estabelecerem no país e prestar serviços diretamente ao cliente por meio de sua subsidiária brasileira. Exemplos são: controle cambial que exige celebração de contrato de câmbio para realização de remessas ao exterior, uso reduzido de cartão de crédito internacional, exigência de nota fiscal e pagamento em Real pelo consumidor local, dentre outros.

Por estarem estabelecidas no país, essas empresas estão sujeitas, em regra, à tributação das suas atividades por IRPJ e CSLL a uma alíquota combinada de 34%, PIS e COFINS a uma alíquota combinada de 9,25% e ISS a uma alíquota que pode variar de 2% a 5%.

Além dos tributos devidos nas operações locais, essas empresas ainda estão sujeitas ao recolhimento de tributos incidentes na importação de serviços e licenças das empresas do grupo que de fato detêm os direitos sobre as plataformas. Nestes casos, a subsidiária brasileira deve ainda reter IRRF à alíquota de 15% ou 25% e recolher IOF à alíquota geral de 0,38%, PIS-Importação e COFINS-Importação a uma alíquota combinada de 9,25%, ISS a uma alíquota que pode variar de 2% a 5% e CIDE à alíquota de 10% em alguns casos.

Afirmar que as empresas inseridas nesse contexto não recolhem tributos no país não parece sensato. Inclusive, para afastar essa imagem de sonegadoras e mostrar a expressiva carga tributária a que estão sujeitas, algumas big techs passaram a publicar o montante de tributos recolhidos aos cofres brasileiros. Essas cifras estão na casa de bilhões de reais por ano.

Segundo, não podemos esquecer que o Brasil adota o sistema de tributação da renda na fonte, o que já autoriza o governo brasileiro a arrecadar parcela considerável dos valores remetidos ao exterior para remunerar as empresas que não têm presença física no país. Logo, mesmo que as big techs não tenham subsidiárias locais, os valores pagos pelos consumidores brasileiros estão sujeitos ao IRRF à alíquota de 15% ou 25% e também ao IOF, que pode chegar a 6,38% se o método de pagamento for cartão de crédito.

Além desses tributos, o consumidor brasileiro ainda fica sujeito ao recolhimento dos já mencionados tributos incidentes na importação de serviços e licenças (9,25% de PIS-Importação e COFINS-Importação, 2% a 5% de ISS e 10% de CIDE).

Se esses tributos não estão sendo recolhidos de forma eficiente, o problema não está na ausência de taxação e a solução, definitivamente, não reside na instituição de mais um imposto sobre serviços digitais. O sistema brasileiro já foi desenhado para tributar na fonte a renda de empresas que oferecem serviços no país e tem sido eficiente com relação a grande parcela das operações.

É preciso separar os problemas tributários enfrentados por outras jurisdições que não adotam mecanismos capazes de atingir a renda auferida por empresas da economia digital dos problemas de fiscalização enfrentados no Brasil. Importar a legislação internacional nesse contexto seria um retrocesso do governo brasileiro.

Autores: Gabriela de Souza Conca e Luiz Roberto Peroba